Uma leitura do louvor - Salmo 150



O capítulo 150 é a doxologia final do livro de Salmos - Gloria in excelsis Deo. Ele é um convite para o louvor a Deus. Aparentemente, este salmo segue uma continuação do mesmo tema do capítulo anterior (149). É provável que ele seja uma mensagem de ânimo e regozijo ao povo de Deus que havia retornado a sua terra natal depois do exílio na Babilônia.

Embora o louvor não seja exclusivamente sinônimo para as canções que entoamos nas igrejas, aqui, o salmista utiliza a expressão especificamente em um sentido musical.

A QUEM LOUVAR?

Não é novidade que o termo louvor está em alta. A expressão ganhou um status profissional, criou uma legião de artistas e uma multidão de fãs enlouquecidos nos arraiais evangélicos. O louvor gospel tirou o gosto amargo do evangelho (Apo 10.10) e deu a ele apenas um sabor de mel. O louvor de hoje mudou o seu facho de luz do céu para as pessoas.

O Salmo 150 aponta que o louvor deve ser direcionado ao Deus que está em seu santuário. Este é o Deus que está assentado em seu trono como Rei governando sobre todas as coisas, cercado por corais de milhares de anjos.

O profeta Isaías, em sua visão do capítulo 6, viu a Deus assentado de forma majestosa sobre um trono. Os anjos ao redor cantavam Santo! Santo! Santo! e cobriam seus rostos, pois não se atreviam olhar diretamente para a santidade desse Deus. Ao ver essa cena, o próprio profeta se prostrou e gritou em pânico: "Ai de mim que vou morrer! Por que sou pecador e meus olhos viram o rei, o Senhor dos Exércitos!". Esse é o Deus ao qual o salmista nos chama a louvar. Quão temível deve ser esta ação!

O versículo 1 nos convida a olhar para o firmamento, ou para o céu infinito, e contemplar o Deus que está além dele. Em outras palavras, o louvor precisa ter a dimensão da grandiosidade de Deus e de como nós somos pequenos e frágeis. Se não reconhecermos isso, se não tivermos essa reverência ao entoar nossas músicas, podemos estar fazendo qualquer coisa ou louvando a qualquer um, menos ao Deus verdadeiro. O som que sai da nossa vida deve agradar a Deus e não ao público ou a nós mesmos!

John Piper diz: "Você não pode louvar o que não valoriza."

Charles Wesley foi, juntamente com seu irmão John Wesley, um importante líder do movimento metodista no século XVIII. Pregador incansável, Charles teve grande contribuição também para a música cristã. Compôs cerca de 9.000 hinos e poesias, muitos deles cantados ainda hoje. Uma de suas letras diz:

Jesus, meu todo-sufiente és,
és meu alívio em meio a dor,
és cura para o coração;
na guerra és paz, na perda és ganho;
és meu sorriso ante o tirano;
na humilhação és minha glória;

Na carência és meu suprimento
e na fraqueza és meu poder;
na prisão me és liberdade;
do mal na treva, és minha luz;
és meu socorro e esteio sempre;
és minha vida e céu, meu tudo!

É esse reconhecimento da pessoa de Deus que precisamos ter e reproduzir em nosso louvor.

POR QUE LOUVÁ-LO?

O salmista convida a louvá-lo pelos atos poderosos (v.2), ou seja, por aquilo que ele tem feito, e por sua grandeza. Isso nos leva a uma pergunta: Qual é a motivação que tem nos levado a louvar a Deus?

Poderíamos listar aqui centenas de motivos pelo qual Deus deve ser louvado. Com certeza você pode neste momento pensar em alguns motivos pelos quais deveria hoje louvar a Deus com toda a sua alma: a cura de alguma enfermidade, um emprego, um livramento ou por ter acordado hoje com saúde e vigor para estar aqui.

Mas, há um motivo pelo qual certamente Deus deve ser louvado todos os dias por todos os crentes redimidos: A graça salvadora de Deus.

Paulo, aos Efésios, capítulo 1 versículos 5 e 6 diz que: "Deus nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da glória de sua graça [...]" - Isso significa que Deus nos amou de uma forma tão especial, que nos livrou da morte eterna e nos fez filhos dEle. Você é salvo pela graça de Deus revelada no sacrifício de Jesus - Não existe motivo maior do que este para o seu louvor!

Aos Romanos 5: 7-8, Paulo diz que: "Dificilmente morrerá alguém por um justo, embora alguem possa se animar a morrer pelo bom. Mas Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores."

Se você é salvo em Cristo você tem motivo o suficiente para entregar a ele o melhor do seu louvor. Com alegria, com reverência, mas com festa também!

C.S.Lewis diz que: "Louvar é o crente se encantar com a beleza de Deus."

Quantas vezes nos omitimos desse privilégio de louvar o Senhor. Nos achamos ocupados demais, com problemas demais para resolver, em uma correria danada, nem abrimos nossa boca para cantar na igreja com alegria. A verdade é que Deus está rindo dessa nossa estupidez. Deus continua sendo Deus sem o nosso louvor. Ainda assim ele continua sendo louvado.

"E, quando já chegava perto da descida do Monte das Oliveiras, toda a multidão dos discípulos, regozijando-se, começou a dar louvores a Deus em alta voz, por todas as maravilhas que tinham visto, dizendo: Bendito o Rei que vem em nome do Senhor; paz no céu, e glória nas alturas. E disseram-lhe de entre a multidão alguns dos fariseus: Mestre, repreende os teus discípulos. E, respondendo ele, disse-lhes: Digo-vos que, se estes se calarem, as próprias pedras clamarão." (Lucas 19: 39-40)

A Confissão de Fé de Westminster diz que: "A luz da natureza mostra que há um Deus, que tem domínio e soberania sobre tudo, que é bom e faz bem a todos, e que, portanto, deve ser temido, amado, louvado, invocado, crido e servido de todo o coração, de toda a alma e de toda a força." - Não perca essa oportunidade de louvar a esse Deus que te deu nova vida, que pagou o preço do seu pecado, que te livrou da morte eterna.

COM O QUE DEVEMOS LOUVÁ-LO?

Dos versículos 3 a 5, o salmista passa a listar uma série de instrumentos musicais comuns naquela época. Não quero entrar na questão de quais instrumentos devemos usar, porque não é disso que o texto trata. Mas o que ele está dizendo é que devemos colocar tudo o que temos para o louvor desse grande Deus. Não devemos medir esforços para oferecer nossos cânticos, nossas ações de graças, tudo o que temos para o louvor do seu nome.

Uma motivação correta, certamente te levará a louvá-lo com mais gratidão. Uma motivação correta, certamente nos levará a conhecer mais a Deus. Uma motivação correta certamente nos levará a louvá-lo com toda a nossa força, com todo o nosso fôlego, em todas as ações, a viver em santidade.

"Quereis cantar louvores a Deus? Sede vós mesmos o canto que ides cantar. Vós sereis o seu maior louvor se viverdes santamente." (Santo Agostinho)

Louvar a Deus é um privilégio que não temos a dimensão. Imaginar que neste momento milhares de outros crentes de vários povos, línguas e nações, estão juntamente entoando cânticos ao nome do Senhor é indescritível! Isso nos leva a pensar na visão apocalíptica do apóstolo João:

"Depois destas coisas olhei, e vi uma grande multidão, que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas, que estavam em pé diante do trono e perante o Cordeiro, trajando compridas vestes brancas, e com palmas nas mãos. Clamavam com grande voz: Salvação ao nosso Deus, que está assentado no trono, e ao Cordeiro.
Todos os anjos estavam ao redor do trono e dos anciãos e dos quatro seres viventes, e prostraram-se diante do trono sobre seus rostos, e adoraram a Deus, dizendo: Amém. Louvor, e glória, e sabedoria, e ação de graças, e honra, e poder, e força ao nosso Deus, para todo o sempre. Amém" (Apo 7: 9-12)

Habitarei para sempre em tua casa


O livro de Salmos é sem dúvida o mais belo e conhecido livro das Escrituras. Crianças, adolescentes, jovens e adultos, crentes e incrédulos já tiveram contato com este livro. Artistas utilizam a sua poesia, cantores reescrevem suas palavras em músicas. Encontramos salmos nos quadros das casas, nas placas de caminhões, na entrada das lojas. Do mais rico ao mais pobre, do monge ao mendigo, donas de casa, executivos, políticos, enfim. Durante muitos e muitos séculos as palavras bíblicas do livro de Salmos tem motivado a vida, os louvores e as orações de milhares de pessoas.

No livro de Salmos Deus é o criador, o sustentador, o protetor, o salvador, o juiz, aquele que estabelece a aliança com o seu povo e quem restaura essa mesma aliança. Em outras palavras, Deus é quem governa todas as coisas. É esse Deus que Israel celebra, confessa e cultua.

Provavelmente nenhum outro dá tanto espaço para expressar o sentimento de aflição de um povo quanto o livro de Salmos. Nele, as orações por auxílio e refúgio e o temor dos inimigos é demonstrado, mas também a confiança em um Deus libertador, que livra os seus filhos das tribulações.

Foi pensando nisso talvez que João Calvino escreveu: "A igreja será sempre libertada das calamidades que lhe sobrevém, porque Deus, que é poderoso para salvá-la, jamais suprime dela sua graça e sua benção."

O capítulo 84 de Salmos é inspirador para canções. Várias músicas traduzem em suas letras o desejo de habitar na casa de Deus. Porém, este texto revela algo a mais do que isso: ele nos revela o quanto geralmente estamos ocupados ou impedidos de ir à igreja.

O versículo 1 do texto demonstra a estima, ou o sentimento, pela casa de Deus - o tabernáculo. O tabernáculo era naquela época o local aonde Deus encontrava-se com seu povo. Era ali que o povo deveria cultuar, oferecer sacrifícios e adorar ao Senhor. Mas, mesmo diante de toda essa estima, o Salmo 84 deixa transparecer que alguns impecilhos privavam o salmista de estar continuamente na casa de Deus, e isso estava lhe causando muito mal. No versículo 2 o encontramos desfalecendo, suspirando pelos átrios do Senhor. Desfalecer tem o significado de perder as forças, desmaiar, perder o vigor. Ele estava desfalecendo pelos átrios do Senhor. O seu coração e a sua carne estavam gritando pelo Deus vivo.

Seu anseio era tão desesperador que ele chega a observar até os pássaros, livres, que conseguiam fazer seus ninhos próximo ao altar da casa de Deus (v. 3), enquanto ele não conseguia se aproximar o quanto desejava. No versículo 4 ele chama de bem-aventurados aqueles que podiam habitar na casa de Deus.

Hoje, já não existem mais as leis cerimoniais do tabernáculo. Mas, embora todos possamos ter acesso a presença de Deus e pedir perdão pelos nossos pecados, e oferecer louvores ao Senhor, ainda existe um local aonde devemos cultuá-lo. A igreja é o mistério de Cristo, é o Corpo do próprio Senhor. É o local aonde a vontade de Deus é ensinada, aonde sua Palavra é pregada, aonde a Sua presença no meio do seu povo deve ser sentida.

Há uma geração crescente em nossos dias de desigrejados, pessoas que perderam o vigor pela casa de Deus. Desfaleceram em um entendimento errado sobre a igreja. Embora hoje tenhamos livre acesso a presença de Deus, muitas vezes deixamos que as ocupações cotidianas nos impeçam de ir a igreja e cultuar o nosso Deus com alegria e sinceridade no coração.

"Visto que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, o Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firme a nossa confissão. Pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas, porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemo-nos, pois, com confiança ao trono da graça, para que recebamos misericórdia e achemos graça, a fim de sermos socorridos no momento oportuno." (Hb 4:14-16)

A igreja é o local onde os filhos de Deus devem estar, é o local aonde Deus ordena sua benção, é à igreja que os irmãos devem trazer os filhos para crescerem diante de Deus, mas ocasionalmente (e as vezes facilmente) escolhemos entre o cobertor e a cama quentinha no domingo pela manhã; entre o compromisso com a igreja e um passeio. Entre ouvir a pregação da sua palavra e qualquer outra coisa. Muitos preferem ficar em casa, e o pior disso é que sempre temos boas justificativas para dar. Mas há um risco muito grande de estarmos desfalecendo.

Spurgeon diz: "Cristãos sem ligação com a igreja são como quem semeia e colhe sem ter celeiro para guardar os frutos da colheita; são úteis, mas incompletos."

Esse é o motivo por que existem tantos crentes angustiados, abatidos, deprimidos, sem fervor espiritual. É a razão pela qual a alegria das crianças e dos adolescentes tem diminuído. É o motivo pelo qual a força dos jovens não tem mais aparecido com tanta evidência. É a razão pelo qual os homens e mulheres, colunas na igreja, tem deixado de sustentar em oração seus ministérios. O nosso amor tem esfriado por que temos priorizados muitas outras coisas, e não a igreja do Senhor. 

Nessa hora, os versiculos 5, 6 e 7 são como uma oração do salmista. Ele sabe que nossa força vem somente de Deus e em meditar sua Palavra. Ele cita o Vale de Baca, que era um local árido de difícil travessia para aqueles que estavam peregrinando por ali. Neste local, existiam poços cavados que enchiam de água no período das chuvas, e essas águas traziam novo ânimo e vigor para os peregrinos.

Há algum tempo, um frequentador de igreja escreveu para um jornal muito famoso. Em sua carta, o homem declarou ao editor que não fazia sentido ir ao culto todos os domingos:

"Eu tenho ido a igreja por 30 anos e durante este tempo devo ter ouvido uns 3.000 sermões. Mas, por minha vida, com exceção de um ou outro, eu não consigo lembrar da maioria deles ... Assim, eu penso que estou perdendo meu tempo e o pastor também está desperdiçando o tempo dele."

Esta carta iniciou uma grande discussão na coluna daquele jornal. Centenas de cartas de outros leitores foram enviadas, mas uma em especial chamou a atenção do editor do jornal, que resolveu publicá-la como resposta:

"Estou casado há mais de 30 anos. Durante este tempo minha esposa deve ter cozinhado umas 3.000 refeições. Mas, por minha vida, com exceção de uma outra, eu não consigo me lembrar da maioria delas. Mas de uma coisa eu sei, todas elas me nutriam e me deram a força que eu precisava para fazer o meu trabalho. Se minha esposa não tivesse me dado estas refeições, eu e nossos filhos estaríamos desnutridos ou mortos. Da mesma maneira, se eu não tivesse ido a igreja para alimentar a minha alma e de minha família, estaríamos hoje em terríveis condições espirituais."

Essa é uma lição para nós hoje. É momento de orar como o salmista e pedir que o Senhor venha nos encher de força e de alegria para estar em sua presença! Adolescentes, jovens e adultos, precisamos abandonar as tendas da impiedade, as tendas daquilo que tem nos afastado de Deus, as tendas das amizades erradas, as tendas da desobediência, as tendas do orgulho do nosso coração, as tendas do entretenimento ilusório, as tendas da falta de compromisso com o Corpo de Cristo, as tendas dos ensinamentos errados, para que Deus também possa achar morada em nossas vidas.

"Vós também, como pedras vivas, sois edificados como casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais, aceitáveis a Deus por Jesus Cristo." (1 Pedro 2.5)

Precisamos voltar a amar a casa de Deus e sua presença, e então poderemos dizer: Vale mais um dia nos átrios do Senhor do que em outra parte mil.

A sabedoria de Deus leva ao conhecimento de Deus



Texto base: Provérbios 4: 18-19

“A vereda dos justos é como a luz da aurora que vai brilhando mais e mais até ser dia perfeito. Mas o caminho dos ímpios é como a escuridão; não conhecem aquilo em que tropeçam.”

A sabedoria de Deus é um dos seus atributos santos, assim como o seu amor, justiça, misericórdia e tantos outros, e o livro de Provérbios se propõe a falar dessa sabedoria.
Durante vários anos o livro de Provérbios foi muito contestado. Não existe no livro nenhuma menção aos grandes acontecimentos da história de Israel ou aos grandes temas proféticos e, por este motivo, muitos chegam a questionar a inspiração divina do livro. Ao contrário dessa opinião, devemos ter em mente que os autores do livro de Provérbios, divinamente inspirados pelo nosso Senhor, estão ensinando sobre a preciosidade da sabedoria de Deus, e como essa sabedoria convida a viver para a glória dele.
Mas o que são provérbios? São ditados curtos, criados observando a vida e o trabalho diário. Dessa observância, os sábios tiravam conclusões e orientações que eram ensinadas ao povo.
O costume de usar ditados proverbiais no ensino não era uma prática exclusiva dos hebreus. A Babilônia, o Egito e várias outras nações também utilizavam ditados para transmitir orientações práticas para a vida. Mas, há uma diferença que fica evidente entre a literatura de Israel, povo de Deus, para as demais nações pagãs. A nação de Israel tinha o ensinamento do decálogo e das Leis do nosso Senhor dadas a Moisés no Sinai, então, os provérbios dos hebreus eram formulados com um princípio: O temor do Senhor.

“O temor do Senhor é o princípio do conhecimento, mas os loucos desprezam a sabedoria e a instrução.” (Provérbios 1:7)

O temor do Senhor e o cuidado para agradá-lo permeava pela vida desses homens sábios de uma forma tão maravilhosa que, os provérbios formulados por eles, tinham em sua mensagem a aplicação na prática das Leis do Senhor. Este era o princípio, e isto diferenciava Israel de todas as outras nações do Oriente Antigo. A proposta do livro era ensinar de uma forma que as Leis de Deus pudessem mudar o pensamento, o coração, e moldar o comportamento daquele povo, e eles buscavam e se dedicavam então a alcançar essa sabedoria.
Segundo o prefácio do próprio livro, os provérbios foram escritos para se conhecer a sabedoria e a instrução; para se entenderem as palavras da prudência; para se instruir em sábio procedimento, em retidão, justiça e equidade; para se dar aos simples prudência, e aos jovens conhecimento e bom siso.
Como isso serve para nós hoje? O início do século XVIII foi marcado pelo surgimento do movimento intelectual chamado iluminismo. O iluminismo entre outras coisas, dizia que o ser humano é capaz de tornar este mundo melhor apenas pelo uso da sua razão, independente da direção de outros.
Obviamente a Palavra de Deus e, consequentemente a tradição reformada, discordam disso. O intelecto humano por mais precioso que possa ser, é incapaz, longe de Deus, de direcionar a vida aqui para um mundo melhor. Essa é a explicação do por que, quanto mais evoluímos na ciência, na tecnologia e todo tipo de conhecimento, a realidade do mundo parece ir de mal a pior.
Infelizmente o iluminismo que nasceu no século XVIII deixou suas marcas, e muitos ainda acham que pelos próprios esforços podem chegar ao conhecimento dos mistérios de Deus.
Paulo ao escrever aos Coríntios em sua segunda carta, diz:

“Mas, se o nosso evangelho ainda está encoberto, para os que se perdem está encoberto, nos quais o deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos, para que não lhes resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus.” (2 Coríntios 4: 3-4)

O livro de Provérbios está nos dizendo que esse conhecimento está perto! Ele nos convida a buscá-lo, ele nos desafia a desejá-lo, a buscá-lo como uma joia preciosa, mais do que o ouro! Ele diz que se necessário devemos dar tudo para alcançar essa sabedoria. Mas, por que o livro usa esses termos ao extremo e é tão importante encontrar essa sabedoria?

O conhecimento da sabedoria de Deus é o conhecimento do próprio Deus. O conhecimento de Deus não vêm do intelecto da razão como diz o iluminismo. Não vem de um momento de euforia e emoção como diz a religião do século XXI. Não se conhecerá a sabedoria de Deus nos livros ou em pesquisas na internet.
Paulo quando escreve ao Coríntios no capítulo 2, em sua primeira carta, diz que a sua palavra, e pregação, não consistiram em palavras persuasivas de sabedoria humana, mas em demonstração do Espírito e de poder, para que a fé [deles, os coríntios] não se apoiasse na sabedoria dos homens, mas no poder de Deus. 
Uma pessoa pode saber muito sobre arquitetura e mesmo assim não conseguir erguer um edifício. Alguém pode saber muito sobre automóveis, mas ser incapaz de construir um carro. Da mesma maneira, alguém pode chegar a saber tudo sobre Deus, e mesmo assim não conhecê-lo. É isso que Paulo está dizendo e é o que ensina o livro de Provérbios. O conhecimento de Deus não pode ser alcançado pela sabedoria humana.

Anselmo de Cantuária entendeu que sua intelectualidade era incapaz de levá-lo a Deus:

“Ó Senhor, encurvado como sou, nem posso ver senão a terra; ergue-me pois, para que possa fixar com os olhos o alto. [...] Seja-me permitido enxergar a tua luz embora de tão longe e desta profundidade. Ensina-me como procurar-te e mostra-me a mim, que te procuro, pois, sequer posso procurar-te se não me ensinares a maneira, nem encontrar-te se não te mostrares a mim.” (Proslogion)

Embora o conhecimento humano tenha seu valor, o ensinamento bíblico é que este conhecimento pela razão é incapaz de levar alguém ao reino celestial, pois não possui essa habilitação. A sabedoria humana deve ser serva da glória de Deus, e não colocar-se acima dEle.

Então, onde encontrar essa sabedoria? O habilidoso autor de Provérbios, utiliza a personificação da sabedoria para ensinar como buscá-la (8: 1-11). Ele diz que ela está clamando! Ela convida a todos os homens! Ela está nas mais altas montanhas, está nos caminhos, nas esquinas, está ao lado das portas, na entrada da cidade! Hoje, essa voz também clama! Qual resposta temos dado? O salmista diz: Se hoje ouvir a sua voz, não endureçais os vossos corações como no dia da tentação no deserto. Essa sabedoria mais tarde também vem ao mundo como um atributo do Filho de Deus, a luz que ilumina todos os homens, Jesus Cristo. O livro de Provérbios aponta para a promessa do amor de Deus para os que buscam conhecê-lo.
Lewis, foi um jovem de uma inteligência brilhante que viveu no século passado. Embora criado na igreja quando criança, ele se rendeu a apreciar sua capacidade intelectual e tornou-se um ateu ainda cedo. Deus o capacitou com uma inteligência acima do normal, e aquele jovem passou a criticar as Escrituras de forma muito forte. Lewis passou a procurar a Alegria em vários aspectos da vida e achava ser possível encontrá-la por meio da sua razão, sem sucesso. Ele é conhecido como o mais relutante dos convertidos e, em sua biografia diz assim:

“Aos 17 anos, Lewis confidenciou a um amigo cristão: ‘Não acredito em nenhuma religião. Não existe absolutamente prova alguma para nenhuma delas e, do ponto de vista filosófico, o cristianismo nem mesmo chega ser a melhor’. Quinze anos mais tarde, ele escreveria para o mesmo amigo, em tom bem diferente: ‘O cristianismo é Deus expressando-se a si mesmo por meio do que denominamos ‘coisas reais’ ... a saber, a real encarnação, crucificação e ressurreição. Essa reviravolta não foi como uma conversão na estrada de Damasco, foram necessários quinze anos para que Lewis mudasse sua opinião.” (DOWNING, David; CSLewis – o mais relutante dos convertidos; Ed. Vida)

Lewis precisou abandonar sua intelectualidade, sua razão, e prostrar-se diante de Deus. O conhecimento de Deus não é algo que conseguimos da noite para o dia. Talvez nunca chegaremos ao conhecimento total do ser de Deus. Mas este é um caminho que precisa iniciar em algum momento em nossa vida. Conhecer a Deus é receber dele uma nova vida, que consiste não apenas em palavras ou em saber os seus mandamentos, mas em uma vida de atitudes transformadas pelo poder de Deus, que nos capacita com essa sabedoria, que vem dele mesmo, a fazer sua vontade.
O caminho dos justos é como a luz da aurora que vai brilhando mais e mais, até chegar a ser dia perfeito. Este é o caminho de todos que foram alcançados pela graça de Cristo. Andemos pois por ele, para a glória de Deus.

Cuidado com os amigos de Jó


A história contida no livro de Jó, aponta para o período de sofrimento de um homem e a sua busca por uma resposta divina que tornasse clara a motivação de todas as calamidades que lhe sobrevieram.

O livro provavelmente remete a um período anterior a 1000. Isso por que suas posses eram medidas pela quantidade de bens que possuía (camelos, ovelhas, bois, jumentos e servos), comuns aquela época e suas terras estavam sujeitas ao ataque de tribos peregrinas.

A tensão do livro tem o seu início em um cenário fora do contexto de Jó. Ele inicia com um teste proposto pelo próprio Deus a Satanás (caps 1 e 2). "Observaste a meu servo Jó? Não há ninguém na terra semelhante a ele, homem íntegro e reto, que teme a Deus e se desvia do mal." - o autor do livro, divinamente inspirado, utiliza logo no início o testemunho do próprio Deus a respeito de Jó, e este prefácio deve nortear toda a leitura do livro. Todo o sofrimento que sobrevirá a Jó não está relacionado a nenhum pecado que ele tenha cometido, isso quem diz é o próprio Deus.

Jó era um sábio de sua época. É difícil compreendermos com exatidão o papel que ele exercia em sua comunidade, devido não ser um costume da cultura ocidental moderna que vivemos. Pelas informações contidas na própria Escritura, sabemos, entretanto, que ele orientava as pessoas com seus conselhos em algum local específico na entrada da cidade. Posteriormente os sábios tiveram um importante papel também no contexto do palácio.

Além de ser um sábio, Jó era um homem religioso. Mas é por causa da sua cosmovisão e a dos seus amigos que o conflito do livro se desenrolará.

Ao saber do sofrimento de Jó, três amigos seus, Elifaz, o temanita, Bildade, o suíta, e Zofar, o naamatita, vieram para consolá-lo (cf 2.11).

Cada amigo de Jó possuía uma característica distinta: Elifaz era o mais bondoso e confiante (cf 4; 5; 15 e 27); Bildade era mais tradicionalista (cf 8; 18 e 25) e Zofar um dogmático determinado (cf 11 e 20). Todos estavam dispostos a trazer consolo e solução para o problema do sofrimento de Jó, e a finalidade da mensagem de cada um era que ele precisava se arrepender do pecado cometido e que resultou naquela sua aflição.

Lembra-te: Quem sendo inocente, jamais pereceu? Onde foram os retos destruídos? Segundo o que tenho visto, os que lavram a iniquidade e semeiam o mal, isso mesmo segam. Com o hálito de Deus perecem; com o sopro da sua ira se consomem. [...] Já examinamos isto, e assim é. Ouve-o e aplica-o para teu bem. (cf 4.7-9 e 5.27)

Os amigos de Jó, eram também ricos em sabedoria e em observar o mundo a sua volta. Como religiosos, "possuíam experiências" para lidarem com aquele tipo de situação. No decorrer do livro cada um vai, portanto, dando a sua "contribuição" para solucionar o problema e afastar aquele sofrimento do amigo. Contudo, Jó não podia dobrar-se diante das belas palavras de cada um. Para ele nada daquilo fazia sentido e não compreendia o que levara YHWH a mudar repentinamente o seu comportamento para com ele.

A medida em que os debates vão se desenvolvendo e a tensão vai aumentando, Jó começa parecer como um orgulhoso aos olhos dos seus amigos por não aceitar suas palavras. Os discursos vão ficando cada vez mais duros e eles passam a acusar o amigo de pecados ocultos que possa ter cometido. Durante todo o desenrolar do livro, um conflito vai se intensificando na mente de Jó, o que leva aos seguintes pontos que não foram considerados pelos seus amigos:

1 - Nem todo sofrimento é causado por algum pecado cometido

Isto estava ficando claro na situação de Jó. A integridade de Jó foi certificada pelo próprio Deus. Isso não significa que Jó não fosse pecador, como todas as pessoas são, mas que, naquela situação específica seu sofrimento não era uma punição pelos seus erros cometidos.

Os amigos e até o próprio Jó tinham, até então, um entendimento retribuitivo do caráter de Deus. Nessa visão, YHWH abençoaria com riquezas, saúde, uma vida feliz e próspera os seus filhos, enquanto estes vivessem uma vida reta e sem iniquidades. Por outro lado, manifestaria o seu lado punitivo quando estes desobedecessem algum mandamento ou cometessem algum tipo de pecado grave. Este entendimento errôneo do caráter divino ainda é intrínseco em algumas visões teológicas atuais, e se acomoda bem a limitação da razão humana aonde todo problema deve ter um culpado, todo bem é pago com o bem e todo mal sempre deve ser punido.

2 - Respostas prontas não respondem todos os problemas

Os amigos de Jó não queriam aceitar que todo o seu conhecimento teológico e as suas experiências religiosas não podiam ser aplicadas naquele problema.

“Já examinamos isto, e assim é. Ouve-o e aplica-o para teu bem.”

Tudo entraria em colapso se Jó não reconhecesse sua culpa em toda aquela situação! Os argumentos, o conhecimento e as experiências, tudo teria que ser revisto por seus amigos. Os amigos de Jó estavam diante de um problema novo e desconhecido, e suas respostas autoritárias e requentadas não podiam solucionar.

O problema dos amigos de Jó não está distante de nós, muitos séculos depois. Muitos pastores tem se acomodado a oferecer respostas prontas para os problemas de suas igrejas. Eles estão convencidos de que as suas respostas são corretas, pois já aplicaram-na em muitas outras situações. Ao se depararem com situações diferentes, apelam para uma oratória cheia de autoridade, onde qualquer resistência em aceitá-la é considerada também resistência à disciplina do Senhor.

3 – A única saída de Jó era para o alto

Jó estava convencido de que seus amigos não estavam com a razão em seus depoimentos. A tensão do livro muda de ângulo quando ele também muda o foco do seu questionamento. Agora Jó questiona Deus sobre o motivo da mudança de sua atitude para com ele. O debate chega ao clímax: Jó lança o seu desafio a Deus (cap 31), e Deus responde com outro desafio (caps 38-41). Quem vencerá este duelo? O capítulo 42 nos mostra o vencedor. Poderia Jó desafiar a soberania de Deus?

A ânsia por um culpado e por respostas ficam para trás quando percebemos que a proposta inicial do livro foi correspondida. O teste inicial lançado por YHWH foi realizado com sucesso. A integridade de Jó foi atestada à Satanás, mesmo que este tenha sido submetido a tal sofrimento. Derek Kidner está correto quando diz:

De uma vez por todas, as cenas de abertura deixam claro que o sofrimento não implica necessariamente em qualquer culpa na vítima, falhas em suas precauções ou até mesmo em sua fé. Seja lá qualquer palavra áspera que Jó venha a dizer e posteriormente retratar, e seja lá qual pecado ele tenha cometido como o resto de nós, o prólogo deixa claro que seu sofrimento não tem nenhuma relação com qualquer uma destas coisas. Portanto, longe de ter algo a ver com culpa, foi exatamente a sua inocência que o expôs a todo este martírio, o que Deus fez questão de reiterar por duas vezes (1:8; 2:3)

Jó não obteve as respostas que desejava no início. Entretanto, o conhecimento mais profundo e real que ele adquiriu de Deus o fez perceber que a sua cosmovisão, assim como a dos seus amigos, era até então equivocada e incapaz de solucionar aquele problema. Foi necessário Jó aceitar que as experiências e respostas humanas são limitadas comparadas a infinitude do Senhor.
Com os ouvidos eu ouvira falar de ti, mas agora te vêem os meus olhos. (cf 42.5)


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